quinta-feira, 25 de agosto de 2011

CNBB e Cáritas lançam campanha SOS África

24/08/2011 | CNBB/Cáritas/Eclesia
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Cáritas Brasileira deram início à Campanha SOS África de ajuda às vítimas da seca na região nordeste do continente, conhecida como Chifre da África (Somália, Uganda, Etiópia, Quênia, Djibuti e Eritréia).

A região, principalmente a Somália, passa pela seca mais intensa dos últimos 60 anos. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), cerca de 12 milhões de pessoas estão sentindo os efeitos da fome na região.

Ainda segundo os dados, o Chifre da África vem sofrendo nos últimos meses, além da seca, com a fome, conflitos e a alta dos preços dos alimentos. A crise na Somália já matou 30 mil crianças de fome.

Cerca de 400 mil refugiados somalis, quase 5% de toda a população do país, encontram-se acampados em Mogadíscio e áreas ao redor. Aproximadamente 100 mil pessoas chegaram somente em junho e julho, segundo a ONU.

Um novo relatório da Organização Católica para a Solidariedade e ajuda humanitária sublinha que "a cada 11 semanas", dez por cento das crianças somalis com menos de cinco anos "perde a vida".

O ‘Situation report' da Cáritas Somália, enviado à agência Fides, do Vaticano confirmou que "as estruturas de saúde da Somália estão a tentar enfrentar a chegada maciça de deslocados internos que estão a lotar os centros urbanos em busca de assistência".
Para reverter essa situação, você pode contribuir com campanha da CNBB e Cáritas, em favor das vítimas no Chifre da África, através de doações de qualquer valor.

Banco do Brasil: AG. 3475-4, C/C 26.116-5
Caixa Econômica Federal: AG. 1041, OP. 003, C/C 1751-6
Banco Bradesco: AG. 0606-8, C/C 187587-6
*para DOC e TED o CNPJ é: 33.654.419/0001-16

Mais informações: http://www.caritas.org.br



Fonte: www.cnbb.org.br

Escravidão negra: 30 milhões de histórias não contadas

Nesta terça, 23 de agosto, o mundo celebra o Dia Internacional da Memória do Comércio de Escravos e sua Abolição. A África é o continente onde haverá o maior número de eventos pela ocasião, começando pelo Gana e estendendo-se à República Democrática do Congo e ao Senegal.

Também outros países relembram a data a partir das suas comunidades afrodescendentes, como os EUA, Canadá, Granada, Trindade e Tobago e Reino Unido.

Segundo a Rádio ONU, escolas ligadas à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, UNESCO, na África, no Caribe, na Europa e na América do Norte, estão desenvolvendo um projeto que prevê o ensino de matérias sobre o comércio transatlântico de escravos. O intuito é o de resgatar a história desses povos e promover o diálogo intercultural.

O Dia Internacional da Memória do Tráfico de Escravos e sua Abolição foi celebrado pela primeira vez no Haiti, em 1998. As comemorações de 2011 coincidem com as celebrações do Ano Internacional dos Afrodescententes, instituído pela ONU, sob o lema "30 milhões de Histórias Não-Contadas", em alusão ao número de escravos deportados.

Universitários angolanos
Estudantes angolanos e peritos internacionais discutem nesta terça-feira (23) o Comércio Transatlântico de Escravos numa conferência sob o lema "Escravos de Angola povoaram também lugares como as Ilhas Holandesas".

O evento apoiado pela Organização da ONU para Educação, Ciência e Cultura, Unesco, será realizado na Universidade Agostinho Neto, em Luanda, para marcar o Dia Internacional da Memória do Comércio de Escravos e sua Abolição.

Em declarações à Rádio ONU, de Luanda, o diretor do Museu Nacional da Escravatura, José Lourenço, falou da relevância do debate com estudantes universitários angolanos.

"O objetivo é honrar a memória das pessoas que foram vítimas do fenômeno e violação dos direitos. Honrar essa memória é perpetuar o conhecimento sobre aquilo que existe e, ao mesmo tempo, criar interesse nos estudantes universitários atuais por essa temática, motivando estudos a respeito", explicou.

Fonte: www.vermelho.org.br

Marcha indígena por terra e justiça em Dourados

Madrugada. O fogo na entrada dos acampamentos começa a receber mais gente. É hora de se aquecer um pouco e partir para os rituais de benção e batizado dos documentos da Aty Guasu. Eles serão levados a Dourados, para a marcha e posterior entrega às autoridades. A principal avenida da cidade será tomada pela "gente cor da terra", os primeiros habitantes da região estarão fazendo ecoar seus gritos de "queremos nossas terras", "exigimos justiça", "exigimos respeito e dignidade". http://www.youtube.com/watch?v=csyNRH0aFx4

Mas de 500 Kaiowá Guarani e Terena, percorreram mais de três quilômetros da região central da cidade na Av. Marcelino Pires. Cantando e manifestando sua indignação e esperança, vão andando alegremente pela avenida. Chamam atenção do comercio e transeuntes pelas vestimentas rituais, cocares, colares, pinturas...faixas e cartazes. Distribuem o folheto "Em Defesa dos Povos Indígenas de Mato Grosso do Sul". Ali constam os índices alarmantes da violência em que se debatem as comunidades Kaiowá Guarani, confinadas ou acampadas à beira das estradas da região. "Não podemos aceitar calados e passivos tanta violência e impunidade. A sociedade precisa reagir a tanta infâmia e injustiça contra nossos irmãos indígenas, tratados pelo governo do estado de forma parcial e injusta". E as chamadas nos dão a dimensão da gravidade da situação "Violência e Barbárie estão às soltas em MS" " A difusão do preconceito é uma das armas do latifúndio". Ao receberem o folheto, as reações dos cidadãos eram bem diversas. Alguns demonstravam seu tímido apoio à manifestação e outros expressavam sua contrariedade, movidos pelo preconceito secular e ideologia racista.

A marcha prosseguiu por quase duas horas, até chegar ao prédio da Funai. Entraram na sede do órgão e dentro dele fizeram um rápido ritual para trazer os bons espíritos ao local e afastar tudo que possa prejudicar os direitos indígenas. Na parte inferior do prédio estava um grande pôster em que o então presidente Lula e vários ministros fizeram a entrega do premio de Direitos Humanos dados aos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, através do Conselho da Aty Guasu. A estatueta foi levada ao centro da manifestação, para chamar atenção a esse importante reconhecimento da luta Kaiowá Guarani por seus direitos.

Mais violência sem providência
Lide Lopes, de Pyolito Kue, ligou falando de mais um covarde ataque dos pistoleiros, causando uma absurda situação de violência, destruição e pessoas feridas. Por se tratar já da terceira ação violenta que sofreram em menos de duas semanas, entendem ser essa uma obstinada decisão dos senhores do agronegócio, de impedir o reconhecimento das terras tradicionais Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul.

É uma absurda declaração de guerra, onde de um lado estão homens armados e decididos a atirar, expulsar, destruir enquanto do outro lado está uma centena de homens, mulheres e crianças armados apenas de seu direito de retornar a um pedaço da terra da qual foram expulsos há poucas décadas. Os Kaiowá Guarani estão sendo alvo de uma ignominiosa ação violenta, enquanto o Estado brasileiro se mostra inoperante diante de tais fatos. Será que serão necessários novos massacres para que se tome providências?

Certamente não é por desconhecimento da gravidade da situação que a polícia federal não está se fazendo presente no local. E quando se fez presente(PF-Naviraí) foi acompanhada dos algozes dos índios, para dizer, como noticiou a imprensa, de que não existem índios no local.
Até quando grassará a violência e a impunidade contra os povos indígenas Kaiowá Guarani no Mato Grosso dos Sul.

* Egon Heck, Povo Guarani Grande Povo.

Fonte: Cimi MS

Documento mostra desafios e avanços nas reparações às vítimas do conflito interno

Camila Queiroz

Jornalista da ADITAL

Adital


Em 2006, o Peru promulgou a Lei 28592, que cria o Plano Integral de Reparação (PIR) às vítimas do conflito armado interno, ocorrido entre anos 1980 e 2000 sob o governo de Alberto Fujimori. Para fazer um balanço do que foi realizado até agora, aproveitando o início do governo de Ollanta Humala, o Instituto de Defesa Legal (IDL) lançou, ontem (23), o documento Avanços e desafios nas reparações às vítimas da violência política.



A publicação se debruça sobre os programas de reparações simbólicas – voltados para educação, saúde, restituição dos direitos cidadãos, moradia e gênero –, tomando por base as ações desenvolvidas pela Comissão Multisetorial de Alto Nível (CAMN), encarregada de implementar as reparações.



"Apesar de termos visto que a Comissão executou ações no tema das reparações coletivas, seu proceder, no caso das reparações econômicas individuais, tem gerado mais o rechaço e as críticas das organizações de vítimas que reclamam não terem levado em conta suas propostas e as dos organismos da sociedade civil que vinham participando na Comissão, que tampouco foram informados”, aponta o documento.



Já nas áreas de saúde, educação e direitos cidadãos, o IDL considera que não houve avanços "substanciais”. Muitos dos avanços, inclusive, ficaram a cargo de organizações da sociedade civil (sem o apoio da CAMN), como organizações de vítimas, organizações não-governamentais (ONGs) e centros universitários.



De acordo com o documento, o governo não avançou muito, por exemplo, nas reparações simbólicas, previstas no Programa de Reparações Simbólicas. Apenas construiu monumentos que não estão recebendo a devida manutenção.

Em todo o Peru, houve 47 construções, 16 delas na região de Ayacucho e 11 em Lima.Contudo, o governo central está desenvolvendo o projeto "Lugar da memória", local que representará a tragédia do período ditatorial. A sede será localizada no distrito de Miraflores, em Lima.

Sobre o assunto, o relatório recomenda fechamento de locais símbolos de violações dos direitos humanos; que se recorde os heróis da pacificação, pondo seus nomes em ruas, praças, pontes, estradas, distritos ou regiões, em acordo com as vítimas;

Inclusão, como Heróis pela Paz, das pessoas falecidas inscritas no Registro Único de Vítimas (RUV).

O tema da equidade de gênero também é criticado, pois, segundo o documento, o Plano Integral de Reparação "carece deste enfoque". Uma das críticas se volta ao fato de o programa reconhecer como violência sexual apenas as mulheres que sofreram violações. Para o Instituto de Defesa Legal, é necessário reconhecer os casos de escravidão sexual, gravidezes forçadas, prostituição forçada ou uniões forçadas, abortos forçados, desnudamentos públicos e toques indevidos.

Até julho de 2011, foram registradas 1.555 vítimas de violação sexual durante o conflito armado e 357 casos estão em processo de qualificação. Apesar disso, até o ano passado haviam sido apresentados 538 casos de violações ocorridos em 60 bases policiais e militares e nenhum dos culpados sofreu sanção.

A publicação solicita, como forma de avançar neste ponto, assessoria jurídica para as mulheres, pedido de desculpas de representantes do Estado específico para as mulheres que sofreram violência sexual; e cota de 50% das bolsas do Programa de Reparações em Educação.

A situação também não progrediu para os peruanos e peruanas que tiveram suas casas destruídas durante o conflito ou enfrentaram problemas de moradia em decorrência dele. A reparação das moradias, voltada principalmente para as pessoas que sofreram deslocamento forçado, são classificadas como "quase inexistentes” pelo IDL.

De modo geral, a publicação sugere que as ações sejam mais descentralizadas, dividindo-as entre governo central (que atualmente as concentra), regionais e municipais. Além disso, é importante dar continuidade às reparações coletivas, com componentes integrais e simbólicos; melhorar delineamentos do Programa de Reparações em Saúde; vincular reparações simbólicas ao tema da memória; e trabalhar melhor o tema da conciliação, entre outras recomendações.

Para ler o documento, acesse o link
http://www.idl.org.pe/comunicado/avances.pdf

II Seminário Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo - Brasília DF

Relatório


Introdução:

O II Seminário Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo ocorreu em Brasília, de 11 a 13 de agosto de 2011, organizado pelo Grupo de Trabalho de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, da CNBB, teve como objetivo compreender o panorama atual da temática no Brasil, identificando problemas, indicadores e ações desenvolvidas para fortalecer a ação sócio-pastoral frente a essa realidade em nosso país.

No âmbito da parceria com o Ministério da Justiça e com as demais entidades organizadoras do evento, teve como finalidade também discutir e apresentar propostas para o II Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil.

Este evento é continuidade de um caminho iniciado com o I Seminário Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que foi organizado pelo Setor Pastorais da Mobilidade Humana/CNBB, em 2008. Mas também significa um novo patamar de reflexão e fundamentação das ações pastorais da igreja no campo da dignidade humana. Desde o I Seminário vários passos foram dados, inclusive a criação do GT – Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, em 2010, a aproximação com o GT – Trabalho Escravo, a coleta de assinaturas em prol de uma Campanha da Fraternidade voltada para essa temática (juntamente com o tema do Trabalho Escravo), ampliação das ações da Rede Um Grito pela Vida/CRB.

O II Seminário é também uma oportunidade de debates e proposição de sugestões ao II Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que está em sua fase de elaboração.

A igreja ao motivar e junto com os parceiros (MJ e CRS) viabilizar a realização desse seminário está respondendo aos gritos das vítimas de tráfico de pessoas e trabalho escravo, bem como contribuindo para que a dignidade humana seja a base das políticas públicas que visam construir um país melhor e onde todos e todas sejam plenamente cidadãos.


Dia 11 de agosto


“Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância”. Com estas palavras, Ir. Rosita Milesi deu início à sessão de abertura, fazendo referência que esta mensagem bíblica abre a Perspectiva n. 5, das propostas de Ação das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora no Brasil, e que é, portanto, inspiração e motivação para todos aqueles e aquelas que desejam agir na defesa da vida e da dignidade humana.
A seguir Dom Leonardo Ulrich Steiner, Secretário Geral da CNBB, acolheu e saudou os participantes do Seminário. Em suas palavras de abertura, ressaltou que o ser humano e a proteção e respeito à sua dignidade devem ser acima de tudo o nosso horizonte, recordando sempre a nós mesmos e à sociedade que toda pessoa humana tem um jeito de Deus, uma dignidade toda especial, gestada na própria encarnação do Filho de Deus. Se esse seminário nos ajudar a crescer nesta ótica, para a superação do tráfico de pessoas e do trabalho escravo, já teremos feito muito. Deixemo-nos iluminar para que possamos ser uma multidão que vai ajudar a multiplicar a idéia de limitar e mesmo eliminar o tráfico de pessoas e o trabalho escravo.
Seguiu-se um momento de reflexão e mística a partir da iluminação bíblica das bem-aventuranças (Mt, 5,1-12) e da premissa “Na dignidade humana está a nossa felicidade”. O momento orante reforçou a idéia de que a construção da paz passa por ações efetivas de enfrentamento a tudo que desumaniza e ameaça a vida em sociedade. O tráfico de pessoas e o trabalho escravo são incompatíveis com a dignidade humana, e felizes serão os homens e mulheres organizados na sociedade civil e em parceria com órgãos do próprio Estado que denunciarem esse crime hediondo e atuarem firmemente na redução das situações de vulnerabilidade social. O refrão de um dos cantos traduz bem o sentimento que permeou to essa mística inicial: “Um grito pela vida tão sofrida quero ouvir! Milhares de outras vozes solidárias vão se unir! Não mais o trabalho escravo, não mais a exploração!...No grito, a dor e o pranto do canto-libertação!”.


Composta a Mesa com representantes das entidades promotoras do evento, fizeram uso da palavra Dom Enemesio Lazzaris (Bispo de Balsas-MA), falando em nome da Comissão Episcopal para o Serviço da Caridade da Justiça e da Paz, afirmou a preocupação da CNBB frente à realidade do tráfico humano e do trabalho escravo, considerando essas situações um desafio a ser enfrentado pela igreja a partir de sua ação pastoral e evangelizadora; Dr. Paulo Abrão (Secretario Nacional de Justiça), pelo Ministério da Justiça afirmou a preocupação do Estado Brasileiro em dar continuidade à Política de Enfrentamento ao Tráfico e instou aos presentes para que participassem ativamente no processo de elaboração do II Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, alem de ressaltar a disponibilidade ao diálogo com a sociedade civil; Rogenir Almeida Santos Costa (CRS), pela Catholic Relief Service expressou o interesse desta instituição em continuar a apoiar as iniciativas que resultem na redução ou efetivo término da exploração pelo trabalho escravo e tráfico humano; e Pe. Sidnei Marco Dornelas, pelo Setor Mobilidade Humana situou o processo de construção do GT-Enfrentamento ao Tráfico Humano, a proximidade e o trabalho em comum com o GT do Trabalho Escravo.


Dia 12 de agosto

Um momento de mística marcou o início dos trabalhos trazendo presente a gravidade da dominação e violência a que ficam submetidas as pessoas vitimas do trafico ou de trabalho escravo.

Para superar esta situação, várias forças externas e solidárias precisam agir para possibilitar a este ser humano condições mínimas de poder vislumbrar um horizonte de liberdade e, então, com suas ainda poucas, mas resistentes forças, retomar o seu caminho.

A primeira sessão de trabalhos teve como expositora Márcia Anita Sprandel que problematizou a questão do tráfico de pessoas em âmbito internacional e no Brasil e trouxe informações sobre a CPI do Tráfico de Pessoas, ora em andamento no Congresso Nacional.

Seguiu-se um amplo debate, onde se percebeu a dificuldade conceitual que cerca o tema do tráfico de pessoas, a multiplicidade de percepções e também de informações sobre esta temática. Contribuem para isto as distintas apropriações da definição de tráfico de pessoas nas dimensões jurídica, sociológica, política e pastoral.

A segunda sessão esteve a cargo do Coordenador Nacional Anti-tráfico, da Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça, Ricardo Lins, acompanhado pelo DPF Alexander Taketomi Ferreira, da Divisão de Direitos Humanos da Polícia Federal.

Ricardo Lins reforçou a importância do papel da sociedade civil na avaliação do I PNETP e relatou como está sendo implementada a elaboração do II Plano, informando que o Grupo de Trabalho Interministerial, estabeleceu várias modalidades de participação, como, por exemplo, consulta virtual no site do MJ e a realização de Plenárias Livres em diferentes partes do país para que as especificidades e demandas de cada localidade ou região sejam incorporadas ao Plano. Sugeriu que as Pastorais e demais entidades presentes realizassem plenárias nos estados e que esse seminário também se configurasse como plenária livre para apresentação de sugestões e propostas ao II PNETP.

Ao esboçar quais seriam as modificações de enfoque no II Plano, Ricardo Lins apontou as dificuldades encontradas para atingir algumas das metas do I Plano e as possibilidades de superação.

Ricardo Lins ressaltou a importância de serem enviados à Coordenação Nacional relatórios e informações da sociedade civil, uma vez que estes são indicativos reais do que ocorre pelo país e permitem às instancias federias dirigir-se aos governos estaduais propondo a implementação de aprimoramentos e de ampliação ou de melhoria de serviços.

O DPF Taketomi apontou a necessidade de mudanças na legislação para tipificar outros tipos de crimes afetos ao tráfico de pessoas, bem como acentuou a importância de mudanças no enfoque das políticas públicas, com ênfase também no tráfico interno.

Durante o debate, alguns temas foram expressivos:

• A importância, nesta perspectiva de combate ao TP e TE , da assistência ás vitimas e da penalização dos responsáveis por essas violações e exploração do ser humano,

• A necessidade de maior entrosamento entre os diversos órgãos do Poder Executivo (por exemplo, MDS, MS, MEC e Ministérios da Fazenda e do Planejamento), para que se possa esperar uma atuação efetiva e eficaz no combate ao TP e TE.

• Também foi salientada a importância da pactuação entre os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) se quisermos que o II PNETP produza resultados mais eficazes.

• A importância de garantir na LDO e LOA recursos orçamentários para o enfrentamento ao tráfico, com ênfase nas políticas de atenção as vítimas (envolvimento maior dos CRAS e CREAS).

Na parte da tarde realizou-se um painel com relatos de experiências:

A primeira apresentação foi de Irma Henriqueta Cavalcante, CJP Norte 2, da CNBB, falando seu trabalho na área de tráfico de pessoas com fins de exploração sexual. Enfocou, de modo muito particular a gravidade do problema e da vergonhosa exploração que ocorre em relação a crianças e adolescentes, principalmente na região do Pará e Amapá. Destaca que esta é uma realidade marcada pela pobreza, abandono, vulnerabilidade, medo e silêncio. Cita alguns elementos que ela chama de dura realidade, isto é: inexistência de políticas de proteção de direitos; servidores e profissionais pouco preparados, indiferentes, desconhecedores e, às vezes, até coniventes com as práticas criminosas. Apresenta, também, algumas causas: pobreza, falta de meios de garantir a subsistência, a mulher vista como objeto sexual, violência doméstica e cultura da impunidade. Como desafios ela pontuou: a) é preciso superar a indiferença; b) romper o silêncio; c) denunciar todo e qualquer tipo de violação (aos direitos humanos); d) reforçar a prática de fiscalização e cobrar a execução das políticas de Estado; e) exigir investigação e punição dos culpados; f) atacar as causas que estão à raiz desta problemática.

Carla, do Centro Pastoral do Migrante/SPM, relatou situações de trabalho degradante e suas conseqüências para o trabalhador e sua família, destacando, também, a vulnerabilidade e as dificuldades de acesso a políticas públicas. Apresentou a extensão do trabalho que realizado o Centro Pastoral do Migrante, em S. Paulo, abrangendo tanto a orientação, quanto a assistência social e jurídica aos migrantes na região de S. Paulo. Destaca-se, neste serviço o apoio para que o maior número possível pudesse se beneficiar da Anistia 2009 e agora na transformação em permanência.

Frei Xavier Plassat, da Comissão Pastoral da Terra, vem de longa data acompanhando o enfrentamento ao trabalho escravo. Em sua reflexão ficou evidente que por todo o Brasil ocorrem situações análogas ao trabalho escravo, sendo que o Pará, Goiás, Tocantins e Maranhão aparecem como os estados com maior número de denúncias – dados computados a partir de 2002 até o primeiro semestre de 2011. A origem dessa exploração é sem dúvida a pobreza extrema e a vulnerabilidade social dela decorrente, principalmente onde o Estado não se faz presente para implementar políticas de assistência. Mas a impunidade dos empregadores (do agronegócio ou de outros tipos) ainda é um dos grandes entraves para a resolução definitiva dessa situação degradante de trabalho. Sublinha Pe. Xavier que o trabalho escravo constitui “vidas sacrificadas no altar da ganância” e sublinha que os três pilares deste crime são: a miséria, a ganância e a impunidade.

A partir das 16 horas, houve trabalho em grupos, seguindo um roteiro prévio de questões, as quais versaram fundamentalmente sobre três eixos: 1) prevenção ao tráfico de pessoas; 2) incidência e políticas públicas; 3) cuidado e atenção às vítimas. Ressaltou-se que neste contexto os grupos elaborariam sugestões e propostas para o II Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.

No final da tarde, em plenário, foi feita uma apresentação pela Polícia Rodoviária Federal, destacando os vários projetos que esta desenvolve em âmbito nacional ou regional, focando ações e indicadores que norteiam o combate, sobretudo à exploração e tráfico de crianças.

Dia 13 de agosto

Iniciou-se com a Mística, preparada e coordenada pela equipe “Um Grito pela Vida”. A reflexão partiu da triste realidade que vimos nos relatos do dia anterior e propôs que partamos da Luz de Cristo, buscando sempre nesta luz, a força, a generosidade, a persistência na luta do enfrentamento ao hediondo crime do tráfico de pessoas e trabalho escravo, bem assim de tudo o que ofende a dignidade humana.

Seguiu-se a plenária do trabalho em grupos. O resultado foi o seguinte:

Grupo1: Prevenção ao Tráfico de Pessoas

Pergunta 1 – Desafios na Prevenção

• Dar visibilidade ao problema e às questões relacionadas ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo
o Sensibilizar, informar, conscientizar, promovendo campanhas educativas e de informação, entre outras iniciativas;
o Preparar multiplicadores para difundir informações e esclarecimentos nas comunidades;
o Desenvolver uma metodologia mais apropriada para dar visibilidade a esta realidade, fazendo uso, sobretudo, das TIC’s;

• Ampliar as investigações e inquéritos, para reduzir a impunidade;
o Incidir juntos aos órgãos de investigação e Justiça (Polícia Federal – PF, Polícia Rodoviária Federal – PRF, Ministério Público, Judiciário) visando o julgamento dos processos e a penalização dos culpados;
o Difundir os mecanismos de denúncia por parte da sociedade civil para ampliar o trabalho investigativo dos órgãos competentes

• Denunciar as causas do problema e enfrentá-las, iniciando pela superação da pobreza
o Aprofundar a temática e ações em torno da Questão de Gênero
o Denunciar e agir contra a demanda do tráfico para exploração sexual e laboral;

• Participar nos Conselhos para contribuir na definição de Políticas Públicas e de sua implementação;

Pergunta 2 – Propostas ao Poder Público (II PNETP)

• Assegurar a presença do Estado com a realização de Políticas Públicas integradas para as populações expostas ao risco aliciamento e tráfico;
• Divulgar o II PNETP na mídia estatal, com vídeos, filmagens, matérias, impressos, etc.
• Garantir orçamento para estruturas (abrigos, capacitação pessoal, atendimento à saúde), prevenção ao tráfico e para ações integradas de enfrentamento nas localidades onde estão sendo construídas as grandes obras;
• Criar estratégias para que os Ministérios e Órgãos de segurança priorizem o enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo em suas ações;
• Incluir o tema TP e TE nos programas de formação de profissionais que atuam com a população atingida, bem como assegurar o conteúdo de DH nas escolas, voltado aos estudantes e aos educadores;
• Implantar e implementar mecanismos específicos para o enfrentamento do TP nas fronteiras nacionais;
• Desenvolver Campanhas permanentes de enfrentamento ao TP e TE
• Adotar medidas para que o II PNETP seja definido como Política Pública de Estado, articulando os três níveis de governo (Federal, Estadual e Municipal), de modo a garantir a adesão e o compromisso dos Estados e municípios a programas de proteção às vítimas, aos denunciantes e aos defensores de direitos humanos, entre outros.

Pergunta 3 – Estratégias de Ação Pastoral

• Fortalecer e ampliar nossa presença e testemunho nos ambientes eclesiais e não eclesiais (periferias, comunidade, órgãos públicos, Conselhos, etc.);
• Aplicar a didática da Conscientização
• Promover a capacitação dos Agentes de Pastoral, sociais e profissionais;
• Fortalecer a campanha nacional por uma CF sobre Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo, em 2014;
• Inserir o tema nos programas formativos da Catequese, Pastoral Familiar, Formação de Seminaristas, Padres, Religiosos, Pastorais Sociais, movimentos eclesiais, e outros;
• Atuar junto aos Bispos e lideranças nos MCS a fim de que influenciem e introduzam nas programações das TV, rádios e jornais católicos esta temática para que seja mais debatida e difundida;
• Inserir o Tema do TP e TE na V Semana Social Brasileira; Aprofundar e difundir a ética e os aspectos teológicos pastorais do enfrentamento ao TP e TE para iluminar e orientar nossa práxis enquanto Igreja;


Grupo 2 – Incidência e Políticas Públicas

Pergunta 1 - Quais os maiores desafios

• Articulação e mobilização da sociedade civil no enfrentamento ao TP e TE;
• Fragilidade dos mecanismos de participação da Sociedade Civil na formulação e controle das políticas públicas;
• Inter- relação da temática com outras realidades afins ou que afetam este problema.
• Cooptação de lideranças da sociedade e institucionalização dos movimentos sociais;
• Exercício do papel de vigilância e controle social por parte da Sociedade Civil, evitando assumir o papel do Estado na implementação de ações próprias do Poder Público;
• Efetividade das políticas públicas (saúde, educação, desenvolvimento social, etc.) e dos planos de ação, nas diversas esferas do poder público;
• Identificação às vítimas do tráfico;
• Contradições do modelo de desenvolvimento do governo brasileiro;
• Adoção de espaços de consulta pública (audiências, conferências, fóruns) criados pelo governo, muitas vezes, como meros mecanismos de legitimação das ações de governo;
• Inoperância de gestores públicos para com as ainda poucas ou quase inexistentes políticas de enfrentamento ao tráfico e trabalho escravo;
• Visualização das demandas de cada grupo (construção/implementação dos fluxogramas de atendimento);
• Capacitação de agentes de diversas áreas para enfrentar o problema do TP e TE e a reinserção social das vítimas;


Pergunta 02 - Incidência em Políticas Públicas (Contribuições para o II PNETP)

Sociedade:
• Fortalecer as redes de organizações da sociedade civil, para assumir controle social – monitoramento, denúncia, comunicação;
• Potencializar os mecanismos de comunicação;

Estado:
• Aperfeiçoar/ampliar os mecanismos legais de enfrentamento ao TP e TE;
• Efetivar as ações de responsabilização dos culpados e correspondente punição;
• Garantir infra-estrutura/recursos para implementação das ações;
• Articular os diversos setores do poder público e corresponsabilização das três esferas;
• Atingir as raízes do problema (miséria / ganância / impunidade);
• Criar políticas públicas capazes de garantir mudança estrutural, tanto para vítimas, quanto para as pessoas em risco;
• Responsabilizar a mídia pelas informações divulgadas em suas programações;


Pergunta 03 - Experiências motivadoras de outras iniciativas:

• Iniciativas propostas no Mato Grosso e no Maranhão, em parceria com várias organizações, para formação/capacitação dos trabalhadores egressos do TE;
• Maranhão: Acompanhamento de grupos específicos, com apoio institucional para desenvolvimento de projetos de economia solidária (ex: CDVDH e cooperativas)
• Rede Mandioca, articulada pela Cáritas Regional do Maranhão, a partir de uma ação de prevenção ao aliciamento para o trabalho escravo, que teve início no município de Vargem Grande – MA e hoje está articulada em várias dioceses.
• Ações em Pedro II e Oeiras - PI: Projeto do governo do estado em parceria com o CEBI e com a UMA, criação de uma fazenda modelo, com formação para a juventude. (Recebem moradia, terra e incentivo para na criação de caprinos e plantação de lavoura).
• Iniciativa de assentamento rural para egressos do TE em Mgr Gil PI, com apoio da CPT
• Proposta de criação de um SINE rural para intermediação das demandas e ofertas de trabalho rural (PI, MA, PA);

Grupo 3 – Cuidado e atenção às Vítimas

Pergunta 1 – Desafios e dificuldades:

• Ter espaços de acolhimento às vítimas com atendimento qualificado;
• Formação e preparação de profissionais para o atendimento às vítimas;
• Comunicação e articulação das redes de enfrentamento a este problema;


Pergunta 2 – O que o Poder Púbico deve fazer nesta área (sugestões II PNETP)

• Garantir recursos econômicos e implementar estruturas adequadas para o atendimento às vítimas;
• Realizar campanhas na mídia;
• Garantir o funcionamento e fiscalização dos órgãos públicos existentes e a serem criados, voltados ao atendimento e proteção às vítimas.

Pergunta 3 – Identificar entidades, instituições que atuam na atenção às vítimas do TP e TE:

• Atenção às vítimas do TP:
o Rede um Grito pela Vida,
o Serviço Pastoral do Migrante
o Pastoral da Mulher Marginalizada
o Pastoral do Turismo
o Comissões de Justiça e Paz
o Instituto Migrações e Direitos Humanos - IMDH
o Setor da mobilidade humana
o Pastorais Sociais
o Equipes locais da CPT
o Comissões e Comitês de Direitos Humanos
o Casa do Migrante de SP
o Casa do Migrante de Cuiabá
o Centro Burnier - Cuiabá
o Casa do Migrante de Foz de Iguaçu
o Centro de Acolhida do Migrante, de Goiânia (GO)
Nota: Esta listagem é apenas inicial, pois este levantamento terá continuidade, por parte da secretaria do Setor Mobilidade Humana, da CNBB.

• Atenção e reinserção das pessoas resgatadas do Trabalho Escravo

o Comissão Pastoral da Terra, SPM, CDVDH/CB

• Observação Geral: Os participantes do Seminário foram orientados para, além de apresentação de propostas como Grupo (Plenária Livre) para o II PNETP, que participem individualmente da consulta Virtual disponível no site do Ministério da Justiça: www.mj.gov.br, (clicar “Tráfico de Pessoas”, a seguir “Consulta para o II Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.”)


Outras propostas vindas da Plenária:

o Carta moção para aprovação da PEC 438/01 (aprovada)
o Continuar trabalhando intensamente para que a CF de 2014 tenha como tema o Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo.
o Unir os dois GTs, tendo presente a importância de que os dois temas sejam devidamente tratados nas suas especificidades, sem reducionismos;
o Incluir no texto da CF 2013 (Juventude) referências ao grave problema do tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo, pela relevância do tema junto à juventude;
o Sensibilizar os membros do CONSEP quanto à oportunidade da CF-2014 ter como tema o TP e TE;
o Criar canais de comunicação, registro de documentação, banco de dados (site/blog) para divulgação da realidade sobre o TP e TE e como meios de sensibilização da sociedade;
o Enviar à Secretaria Geral da CNBB, por parte dos Regionais (principalmente os mais afetados por esta problemática), de solicitações no sentido de que o TP e o TE sejam um tema/comunicação na pauta da 50ª Assembléia Geral, em Aparecida;
o Assumir, na 50ª AG da CNBB, uma Celebração Eucarística sobre as Pastorais Sociais, contemplando também o tema do TP e TE.

À sequência, Pe. Elio Gasda, sj, apresentou a conferência “Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo: lugar teológico, clamor ético, missão da Igreja.

Em sua reflexão o Pe. Gasda buscou situar a questão do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas a partir de três eixos fundamentais: a) as origens teológicas do problema em questão: as estruturas de pecado e a idolatria; b) as origens da ética cristã: o clamor das vítimas do pecado do mundo; c) os aspectos fundamentais da missão da Igreja em relação a este problema.

Destaca que, em seu entendimento “A crueldade do escândalo do tráfico de pessoas e do trabalho escravo exige uma opção pastoral decidida e inegociável. Sua presença dolorosa e perturbadora é sacramento da presença de Deus clamando por libertação. Em última análise, significa muito mais do que uma ação pastoral. É um autêntico ato de religião. É fazer a vontade do Pai assim na terra como no céu. É profissão de fé levada às últimas conseqüências. É Deus, através de nós, amando e libertando as vítimas: “amai-as como Eu as amo” (Jo 13,34). Neste tipo de amor, já não somos apenas nós que amamos, mas é Deus amando em nós (Jo 17, 21.26). Este gesto de humanidade revela a divindade que habita em nós. Enfrentar o tráfico de seres humanos é assumir a “causa de Deus”. Deus tanto amou o mundo que enviou seu Filho Único, a fim de que “o carrasco não triunfe sobre a vítima”.” Ao final de exposição, Dom Enemésio Lazzaris, membro da Comissão Episcopal para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz, comentou que a exposição foi uma chave de ouro no Seminário, trazendo uma reflexão teológica, eclesiológica e pastoral para nossa ação e vida. Nosso trabalho não é apenas por questões sociais, jurídicas, antropológicas, mas, sim, na mística de que somos filhos e filhas de Deus. Estamos, pois, agindo por uma espiritualidade que deve alimentar-nos e motivar nossa ação e nosso amor compassivo e acolhedor para com nossos irmãos e irmãs, particularmente estes expostos às mais degradantes situações. Conclui o expositor dizendo que a teologia só complementa sua dimensão na práxis.

Seguiram-se três breves exposições, apresentadas por representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Rede Um grito pela Vida e Comissão Pastoral da Terra (CPT).

À tarde, o Seminário contou com uma exposição sobre “Nossa relação com a Mídia: como incentivar o papel político e pedagógico no combate ao tráfico de pessoas”, tema apresentado por Pe. Ermanno Allegri, da Agência de Notícias Adital que, aliás, esteve cobrindo todo o evento.

Ao mencionar o que chamou de elementos novos na mídia independente, ressaltou que “A freqüência e o tamanho das matérias com que o tema é noticiado revelam o valor que esta mídia confere ao assunto”. E sublinha a influência que a mesma exerce na formação da opinião pública. A mídia veicula mais notícias e menos reportagens, o que pode deturpar a reta compreensão do problema e reduzi-lo a simples curiosidade.

Apresentou alguns indicativos importantes, para ajudar a imprensa a qualificar a produção de matérias:
Manter contato com os profissionais da área para, com eles, aprofundar a questão do tráfico de pessoas; analisar o conteúdo das matérias para ajudar os profissionais a aprimorar linguagem e conteúdos; analisar a frequência e tamanho das matérias relativas ao tráfico de pessoas, conferindo se são percebidos os indícios que caracterizam o tráfico na sua origem e na sua continuidade: engano, retenção de documentos, dívida, etc. Sublinha a importância de trabalhar a questão cultural, pois, mesmo tendo presente que o tráfico de pessoas se insere no âmbito do mercado, é importante acreditar que o mercado pode ser re-criado e reorientado pela intervenção de homens e mulheres que, juntos, debatem e determinam uma nova modalidade de vida para humanizar as relações. Sabemos que é um trabalho de longo prazo, mas deve ser pensado e desenvolvido porque não podemos imaginar que só os aspectos legais e coercitivo-repressivos cheguem a mudar substancialmente o quadro de exploração e de aproveitamento do ser humano.

Etapa final do Seminário: Apresentação da minuta do presente Relatório pelas observadoras – Marcia Anita Sprandel e Ir. Rosita Milesi – dedicando especial atenção à revisão e redação final das propostas surgidas tanto nos Grupos de Trabalho, quanto na Plenária. Seguiu-se a Avaliação final e conclusão dos trabalhos.

Brasília-DF, 19 de agosto de 2011.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

OS MIGRANTES E A IGREJA DO CAMINHO

Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS

Em recente artigo veiculado pela Internet – Aos desolados pela Igreja – Leonardo Boff confrontava as instituições atuais da Igreja Católica com o início do cristianismo, a chamada religião do Caminho. Trazia à tona, na verdade, um tema já abordado por ele no livro Igreja, Carisma e poder, que lhe rendeu alguns dissabores com o então Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI. Vale aproveitar o embalo para tecer algumas considerações sobre o binômio templo/caminho como uma tensão histórica que se configura com a imagem de um pêndulo entre um extremo e outro, com as devidas graduações intermediárias. Não será difícil dar-se conta da importância que tem a Pastoral dos Migrantes para o fortalecimento da “fé a caminho”.

O Caminho
De fato, antes de ser Igreja (ou Igrejas no plural) o movimento de Jesus era caminho. Prova-o, primeiramente, os relatos ligados ao nascimento e à infância de Jesus, especialmente no Evangelho de Lucas. Desde o ventre materno, deve deixar sua terra, aventurar-se até Belém “onde não havia lugar para eles” (Lc 2,7). Logo seus pais são forçados a escapar da fúria assassina de Herodes, refugiando-se no Egito e de lá retornando. Históricos ou não, tais relatos revelam que o mistério da encarnação ocorre num contexto acidentado, como o foi o êxodo do Egito e a travessia do Povo de Israel pelo deserto, entes de chegar à Terra Prometida.

Prova-o, em seguida, o próprio itinerário do Jesus histórico que, no dizer do evangelista, “percorria todas as aldeias e cidades (...) e, ao encontrar as multidões cansadas e abatidas, tinha compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor” (Mt 9,35-38). Os estudiosos do Novo Testamento são unânimes em classificar a ação de Jesus como de um profeta itinerante, que “passou pela vinda fazendo o bem”, não a partir do templo, mas a partir da periferia e daqueles que a habitavam: pobres, indefesos, doentes, discriminados, excluídos (At 10,38).

Prova-o, em terceiro lugar, o episódio do Pentecostes e seus desdobramentos, quando os discípulos de Jesus, hermeticamente fechados pelo medo, diante do fim trágico na cruz, foram sacudidos pelo vento forte, pelo barulho e pelo fogo do Espírito (At, capítulo 2). Tornam-se imediatamente apóstolos missionários incansáveis, alargando cada vez mais o campo de irradiação da Boa Nova de Jesus Cristo. Proliferaram então as primeiras comunidades cristãs, cujos retratos apontam para uma nova forma de integrar fé e vida, religião e compromisso social (At 2, 42-47; At 4,32-37). Nos termos do Documento de Aparecida, o Pentecostes pode ser considerado como uma espécie de encruzilhada entre o “ser discípulo” e o “ser missionário”. O episódio dos discípulos de Emaús (Lc 24,13-35) ilustra bem isso: o caminho da ida, do fracasso, da impotência e da fuga, se converte no caminho da volta: entusiasmo que “arde o coração”. Através do encontro com o Ressuscitado, dois discípulos medrosos tornam-se dois missionários ardorosos.

Prova-o, por fim, as grandes viagens do apóstolo Paulo, o qual, tendo-se convertido ao cristianismo, põe-se a transitar pelas rotas do comércio antigo, fundando pequenos núcleos de cristãos nas cidades mais importantes da época: Corínto, Tessalônica, Galácia, Éfeso, Filipos, Antioquia, Roma. Não só os funda, mas passa a alimentá-los através de suas cartas e de suas visitas. Não é sem razão, aliás, que a conversão de Saulo de Tarso em Paulo tenha ocorrido a caminho de Damasco (At, capítulo 9). Numa palavra, diferentemente dos outros povos e culturas, a tradição judaico cristã, para além do templo, desenvolve uma espiritualidade inextricavelmente vinculada ao êxodo, exílio e deserto, como também ao caminho e à travessia.

O templo
O caminho se contrapõe ao templo de Jerusalém, ponto de referência para um tríplice poder: religioso, político e econômico. Por ali passavam os impostos, as decisões do Sinédrio e os sacrifícios litúrgicos. Já no Antigo Testamento, o templo de Salomão substitui a tenda da arca. A provisoriedade da travessia dá lugar à magnificência da fortaleza. O Deus poderoso e onipotente do templo, símbolo da ordem estabelecida, toma o lugar da espiritualidade do Deus a caminho, que “viu a miséria, ouviu o clamor, conhece o sofrimento e desce para libertar”, conforme o chamado “credo histórico” de Israel (Ex 3,7-10; Dt 26,5-10). Alguns profetas, Miquéias entre eles (capítulo 3), se insurgem veementemente contra os sacerdotes do templo. Profecia e sacerdócio régio professavam, de um lado e de outro, um antagonismo irreconciliável. Nos séculos que antecederam e se seguiram à vida de Jesus, o templo representava o coração socioeconômico e político do país, tendo sido destruído pelas forças do Império Romano no ano 70 d.C. Jesus inverte o movimento do pêndulo, deslocando-se do templo para o caminho, ou para os caminhos.

Historicamente, enquanto o templo simbolizava a manutenção do status quo, os profetas procuram atualizar a mística do êxodo para os tempos da monarquia, do exílio e com João Batista e Jesus, para o domínio do Império Romano. Eles questionam o deus estabelecido e rodeado de ouro, trazendo à memória do povo a lembrança de Ihaweh, o Deus que caminha conosco na história. A experiência amarga do exílio já havia contribuído para deslocar o foco da espiritualidade: do templo, da riqueza e do poder para a sabedoria e a relativização dos bens materiais. Deus não está no templo, agora em ruínas, mas em toda parte: no coração de cada ser humano e de cada cultura, na beleza da criação e na arte de saber viver. Êxodo, deserto e exílio depuram a fé, colocando-a sempre a caminho.

A volta do exílio e a reconstrução do templo, entretanto, recria a idéia do Deus forte e poderoso, utilizando a memória de Abraão, Isaac e Jacob, ancestrais do Povo de Israel, mas nem sempre levando em conta seu nomadismo primordial. Desenvolve-se uma ideologia fortemente nacionalista e exclusivista, atrelada a um estrito legalismo, onde o templo centraliza o culto e a moral. Contra isso Jesus se insurge veementemente, de modo especial na fórmula de que “o sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado” (Mc 2,27). Se é verdade que as primeiras comunidades cristãs seguem a trilha inaugurada por Jesus, vários setores do judaísmo permanecem ancorados no Deus do templo, mesmo após a destruição deste.

Mas também para os cristãos, passados os primeiros séculos de nossa era, as coisas mudam após conversão do imperador Constantino, no século IV. O cristianismo é elevado à categoria de religião de Estado, do Império. A espiritualidade do caminho começa um processo, lento mas progressivo, de franca sedimentação. Entre trono e altar se inicia, reciprocamente, uma longa aproximação, que mais tarde terminará em namoro e casamento. Se a idéia do imperador era cimentar e salvar com um novo espírito religioso o poderio romano, este rui e se desintegra no decorrer do século seguinte. Daí para frente, e durante todo o período medieval, irá prevalecer o conceito de Deus do templo, em detrimento do cristianismo do caminho.

O poder central do império se esfacela, mas nascem os poderes locais, ao redor dos senhores feudais. Destronada pouco a pouco a espiritualidade itinerante, instala-se no interior do feudalismo, e a este fortemente vinculada, a hierarquia eclesiástica, simultaneamente reforço e reflexo do próprio sistema feudal. Daí às fogueiras para execução de feiticeiras e hereges, à condenação de sábios e cientistas, às campanhas militares das cruzadas e ao batismo forçado dos indígenas coloniais, o caminho era muito curto. Trono e altar, cruz e espada, padre e soldado constituíam duas faces da moeda. De fato, se “extra eclesia nula salus = fora da Igreja não há salvação”, todo combate ao demônio torna-se legítimo. O resultado não poderia ser outro, senão o fundamentalismo teocrático, cego, intolerante e fanático, acompanhado das várias faces da “guerra santa”.

Entretanto, mesmo no interior dessa noite escura, na base das fortalezas e castelos, palácios e catedrais medievais, nunca a chama do Evangelho se deixou apagar por completo. Sob as cinzas a brasa se mantinha viva. Santa Tereza D’Ávila, São João da Cruz, São Domingos, Santo Inácio de Loyola, São Francisco de Assis, Bartolomeu de Las Casas – entre tantos outros testemunhos – são exemplos vivos da persistência da semente lançada por Jesus Cristo. Muitos santos e santas eram como que estrelas, que brilhavam tanto mais fortes, quanto mais intensa a escuridão. Todos, de uma ou outra forma, tratavam de resgatar a espiritualidade do caminho. A Ordem dos Frades Menores, junto com outras Ordens mendicantes, não nascem à toa. Mergulham suas raízes nos primórdios do cristianismo primitivo, com seus ideais fundamentados na Boa Nova do Evangelho.

Novamente aqui, recrudescem a tensão e os conflitos entre o deus estabelecido e a mística do Deus a caminho. O pêndulo segue oscilando. Na segunda metade do século XIX, em plena “sede de inovações e agitação febril” da Revolução Industrial, surgem os “santos sociais”, fundadores e fundadoras de Congregações marcadamente apostólicas. Surge igualmente o documento inaugural da Doutrina Social da Igreja, a Rerum Novarum, publicada pelo Papa Leão XIII em 1891, e dedicada à “questão social”. Isso no pano de fundo da “onda vermelha” que multiplicava células comunistas por todo continente europeu. Talvez esteja aí o terreno fértil do contexto histórico onde proliferam os precursores do Concílio Ecumênico Vaticano II, sendo este uma nova encruzilhada na história da Igreja Católica.

De volta ao caminho
Abrindo as janelas de uma Igreja com cheiro de mofo aos novos ares e aos desafios do mundo moderno, como insistia o Papa João XXIII, o Concílio Vaticano II representou um impulso inquestionável para um retorno ao caminho. Caminho aqui como metáfora das “alegrias e esperanças, tristezas e angústias dos homens de hoje, especialmente dos que mais sofrem, que são também as alegrias e esperanças, tristezas e angústias dos discípulos de Jesus Cristo” (Gaudium et Spes, nº 1). Nesse mundo “em rápidas e profundas mudanças” (GS, nº 4), engendra-se uma nova eclesiologia, onde a idéia de Povo de Deus substitui o conceito de Igreja hierárquica. Toda a Igreja passa a ser missionária e cada batizado realiza, nela ou fora dela, seu “sacerdócio profético e real”, a um tempo eclesial e ministerial, como serviço ao mundo e à Igreja. O compromisso sóciopolítico diante dos contrastes contemporâneos pressupõe essa nova eclesiologia, não mais nos moldes piramidais da Idade Média, e sim numa visão circular, com o Cristo ao centro, onde as tarefas são distintas mas igualmente reconhecidas, nem melhores ou piores, nem mais importantes ou menos importantes, apenas diferentes (Lumen Gentium).

A Vida Religiosa Consagrada (VRC), juntamente com as Pastorais Sociais, com as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), com a Teologia da Libertação (TdL) e com numerosos entidades, movimentos sociais e organizações não governamentais (ONGs), partilham hoje uma tarefa comum: beber das fontes evangélicas e do carisma correspondente, para retornar ao caminho. Visitar o berço, não para permanecer ali de forma saudosista, mas para avançar em direção à fronteira. Não se trata de construir museus com o fim de contemplar os feitos passados. Os museus podem ser muito úteis, desde que se purifiquem de um narcisismo doentio e ineficaz, para voltar-se aos novos desafios que a história apresenta. Também não se trata de imitar pura e simplesmente os fundadores. Seguir não é imitar, e sim recriar. Imitar é uma forma de trair o espírito e a intuição do carisma, pois a história se transforma e levanta problemas sempre novos. Refaz-se, desse modo, a grande tensão história entre tenda e templo, entre espiritualidade do caminho e culto ao deus estabelecido, entre carisma e instituição (na concepção de Max Weber). Nos tempos atuais, porém, o pêndulo parece tender mais para o lado do poder, da pompa, da grande solenidade, do aparato exterior, da visibilidade de uma Igreja triunfante, do liturgismo, dogmatismo e doutrina... Enfim, de um novo estilo de cristandade.

Convém introduzir um parágrafo sobre a Pastoral dos Migrantes, enquanto presença viva e ativa junto ao universo na mobilidade humana. O Documento de Aparecida, a exemplo de Puebla e Santo Domingo, dedica um subitem “aos rostos sofredores que doem em nós”, privilegiando, entre outros, os migrantes. Estes, com efeito, podem converter-se em protagonistas de um novo tempo. Profetas que, simultaneamente, denunciam estruturas que negam a pátria a milhões de pessoas e anunciam a necessidade de novas relações nacionais e internacionais, na busca de uma nova cidadania. São, não raro, sangue novo nas veias de organismos decrépitos, oxigênio primaveril em sociedade que se encaminham para o outono, abelhas vivas que conduzem o pólen de valores novos para fecundar as flores de outra cultura. Se no coração de cada ser humano e no coração de cada cultura existem sementes do Verbo, o ato de migrar é portador de tais sementes. Conclui-se que “os migrantes que partem de nossas comunidades podem oferecer valiosa contribuição missionária às comunidades que os acolhem” (Doc. Ap., nº 415).

Deste modo, a tarefa hoje se torna mais desafiadora e urgente. Voltar ao caminho é voltar aos porões da sociedade, aos becos e ruas mais obscuras, aos grotões abandonados do campo, aos presídios e prostíbulos, aos assentamentos e acampamentos, às “bocas” de fumo e de crack, aos lixões e periferias... É voltar ao submundo dos pobres e indefesos, órfãos e perdidos, marginalizados e excluídos. Somente uma presença gratuita e silenciosa junto a esses “prediletos do Pai” pode resgatar a espiritualidade do caminho, ou a mística de quem caminha. De fato, quem muito caminha aprende a depurar a mala e a alma, a focalizar o olhar e os passos naquilo que é essencial e a relativizar o que é supérfluo. Em outras palavras, aprende a cultivar tesouros que a traça não corrói nem os ladrões roubam (Mt 6,19-21).

ACNUR lança portal na web sobre emergência no Chifre da África

NAIROBI, Quênia, 19 de agosto (ACNUR) - O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) acaba de lançar um website dedicado a veicular informações detalhadas e atualizadas sobre a situação de emergência dos refugiados e deslocados atingidos pela seca no Chifre da África, com base em informações próprias e de seus parceiros operacionais.

O novo site (disponível em inglês no endereço http://data.unhcr.org/horn-of-africa/regional.php) é um portal de compartilhamento abrangente de informações para todos os parceiros operacionais do ACNUR, dedicados a trazer alívio a milhões de refugiados afetados pela seca, insegurança e fome em toda a região do Chifre da África.

“Este novo portal oferece uma única plataforma, na qual nós e nossos parceiros em toda a região podemos compartilhar informações sobre qualquer aspecto do nosso trabalho,” disse Thomas Albrecht, gerente do centro regional de apoio do ACNUR em Nairobi (Quênia), que hospeda o site. “Em uma crise que avança rapidamente, mais informação significa melhor coordenação entre as agências humanitárias e uma prestração de assistência mais rápida e efetiva”.

Saiba mais em http://www.acnur.org/t3/portugues/
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ACNUR envia especialistas a áreas remotas da Etiópia para ajudar 18 mil somalis

NAIROBI, Quênia, 23 de agosto de 2011 (ACNUR) - A agência da ONU para refugiados enviou uma equipe de especialistas em várias áreas para uma região remota no leste da Etiópia, onde cerca de 18 mil refugiados somalis necessitam urgentemente de ajuda, após fugirem de seu país.

A equipe do ACNUR enviada a Gode inclui especialistas em saúde, nutrição, proteção, coordenação de campo e de registro. Eles foram enviados para a região em cooperação com o governo etíope, outras agências e organizações não-governamentais (ONGs) como parte de uma resposta ao grande número de somalis chegando a Gode.

“A tarefa deles é realizar o cadastro e o perfil dos refugiados recém-chegados, identificar necessidades e oferecer ajuda. Nós também ajudaremos a transportar refugiados dispostos a ser relocados para campos já existentes, em Dolo Ado”, a cerca de 250 km de Gode, explicou Adrian Edwards, porta-voz do ACNUR.

Leia a íntegra desta notícia em www.acnur.org.br
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ACNUR Brasil recruta Assistente Sênior de Soluções Duradouras

Brasília, 23 de agosto de 2011 - O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) no Brasil está selecionando candidatos para o posto de Assistente Sênior de Soluções Duradouras (Senior Durable Solutions Assistant). Todas as informações sobre o Termo de Referência deste posto e outras quest"oes deste processo de seleção estão disponíveis em http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/trabalhe-no-acnur/

Candidato(a)s interessado(a)s devem enviar seu currículo e carta de apresentação até 05 de setembro de 2011 para o e-mail brabr@unhcr.org
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terça-feira, 16 de agosto de 2011

Reportagem sobre os migrantes latinosamericanos em SP‏

Convite para Assistir, hoje no Jornal Nacional, TV Globo, às 20h 30min reportagem sobre os Migrantes latinoamericamos em SP e outra reportagem como mesmo enfoque na TV Bandeirantes, a Liga, às 22h. Duas oportunidades importantes.

Abraços scalabrinianos com votos de paz, saúde e amor divino.
Pe. Paulo Rogério Caovila, cs


A MEMÓRIA E O SONHO

Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS

Outros artigos: www.provinciasaopaulo.com

Uma simbiose entre memória e sonho constitui a dupla face de como a tradição judaico-cristã concebe o tempo. A conquista da terra prometida se contrapõe à lembrança do paraíso perdido. O Povo de Israel se move entre a amarga nostalgia deste e a jubilosa esperança daquela. A passagem do Mar Vermelho deixa para trás a opressão do Faraó. A vinda do Messias haverá de redimir toda culpa, a salvação escatológica apagará o pecado original, a utopia do Reino substituirá o vale de lágrimas. Da mesma forma que Jesus renova o velho Adão, Maria resgata a velha Eva. A ressurreição vence a cruz e a vida e se sobrepõe à morte. Nas palavras do apóstolo Paulo, “onde o pecado foi grande, maior haverá de ser a graça” (Rm 5,20).

Segundo a Carta aos Hebreus e a Carta de São Paulo aos Romanos, Abrão é considerado o pai da fé porque foi capaz de deixar a sua terra natal e pôr-se em marcha, confiante na promessa de uma descendência numerosa e de uma nova pátria. O conceito bíblico-teológico de aliança denota essa aposta do grande patriarca, e de seus sucessores Isaac e Jacob na confiança em Deus. No chamado credo histórico (Dt 26,5-10), a chegada à “terra onde corre leite e mel” pressupõe a penosa travessia do deserto; a êxodo e a libertação formam ambos a contraface da escravidão no Egito. Na espiritualidade dos salmos, a expressão “casa de Deus”, enquanto abrigo sólido, rochedo e fortaleza, é uma poesia invertida da tenda de um povo acostumado ao caminho. Os salmos são poesias e estas costumam representar sonhos que transfiguram as carências da travessia num refúgio final e definitivo. Se, por um lado, o exílio na Babilônia mutila o riso, o canto e a cultura, simbolizados pela harpa emudecida e pendurada nos salgueiros (Sl 137), por outro lado, no retorno à pátria, “os que semeiam em lágrimas ceifam em meio a canções (Sl 126). Ao final, a multidão dos 144 mil salvos, que “lavaram e alvejaram suas roupas no sangue do Cordeiro”, são os que passaram pela “grande tribulação” (Ap 7,1-17).

Em todos esses casos, o esquema se repete em forma de sequência linear: paraíso, queda, culpa, expulsão e promessa de retorno. Êxodo, exílio, diáspora, deportação e dispersão são companheiros do cotidiano de um povo sem pátria. De um ponto a outro, o deserto da travessia, onde a sede e a fome ressecam as forças dos caminhantes. Os pés feridos e os olhos cansados oscilam entre a saudade das “cebolas do Egito” e uma reiterada renovação da esperança em chegar à nova pátria. Mas o deserto só poderá ser fértil mediante uma constante conversão e fidelidade à aliança. Passado, presente e futuro interagem e se interpelam reciprocamente, enquanto vai crescendo a confiança de que o próprio Deus caminha à frente de seu povo.

Conforme tal concepção do tempo, a trajetória da humanidade oscila numa tríplice dimensão temporal: a) projeta-se para trás, bebendo na recordação da obra criadora e na libertação do Egito como experiência fundante e, ao mesmo tempo, amargando o remorso do rompimento e da quebra da aliança, com suas conseqüências negativas; b) faz do momento atual uma oportunidade viva e privilegiada para o arrependimento e a expiação; c) e se projeta igualmente para diante, na certeza final da misericórdia salvífica. É o que constata e problematiza Umberto Galimberti, em seu livro Il tramonto del’Ocidente. Embutida nesse esquema está a idéia moderna de progresso, o qual supõe melhorias constantes. Segunda ela, uma geração deverá ser superior à geração que lhe precedeu. De grau a degrau, a humanidade estaria numa escada em ascensão. Sem dúvida que A origem das espécies, de Darwin, com a noção de seleção natural, contribui para esse conceito de permanente avanço.

O movimento profético do Antigo Testamento é ainda mais explícito quanto ao pêndulo entre a memória do paraíso e a certeza da promessa, esquema histórico em que oscila a trajetória do Povo de Israel. Três expressões fartamente repetidas atestam isso: o lembra-te, a denúncia e o anúncio. O “lembra-te” remete ao passado e à escravidão no Egito, alertando para não repetir semelhante prática e “distorcer o direito do estrangeiro, do órfão e da viúva” (Dt 24,17-18). Implícita ou explicitamente, ele contextualiza a mensagem dos profetas, no sentido de atualizar para os tempos da monarquia e do exílio a experiência fundante do Deus Libertador. Ou seja, se vocês passaram pela dura experiência da exploração por parte de uma nação estrangeira, como podem agora explorar os mais frágeis entre vós?

Quanto à denúncia, faz um retrato do presente. Bastaria um rápido olhar às principais figuras do profetismo israelita para dar-se conta de sua “santa indignação” frente às injustiças e desigualdades sociais. Tanto o “Dia da ira de Javé” quanto as ameaças das potências vizinhas são interpretadas como resposta de Deus à infidelidade do povo, conforme a significativa metáfora do casamento de Oséias. Mas uma pausa no capítulo três de Miquéias é suficiente para constatar a veemência das palavras e a imagem do dedo em riste: “Escutem bem chefes de Judá, governantes da casa de Israel! Por acaso não é obrigação de vocês conhecerem o direito? Inimigos do bem e amantes do mal, vocês esfolam o povo e descarnam os seus ossos; vocês são gente que devora a carne do meu povo e o esfola; quebra seus ossos e os faz em pedaços, como um cozido num caldeirão (Mq 3,1-3).

O anúncio, por sua vez, aponta para o futuro. Aparece como tema de fundo de numerosos poemas que contrastam com a situação de opressão e abandono do povo. Eles encontram-se espalhados pelas páginas de numerosos profetas. Tomemos apenas dois exemplos. O primeiro, do Livro de Isaías, ressalta a criação de “um novo céu e uma nova terra”, onde, “não haverá mais crianças que vivam alguns dias apenas, nem velhos que não cheguem a contemplar seus dias (...). Construirão casas e nelas habitarão, plantarão vinhas e comerão seus frutos. Ninguém construirá para outro morar, ninguém plantará para outro comer, porque a vida do meu povo será longa como a vida das árvores, meus escolhidos poderão gastar o que suas mãos fabricaram” (Is 65, 17-25). O outro exemplo encontra-se no capítulo 37 de Ezequiel, em que um monte de ossos, simbolizando a destruição e morte de Israel, revive e põe em marcha pelo sopro da palavra divina transmitida pela boca do profeta.

É verdade que o passado não muda. Ou melhor, não mudam os fatos sociais. Não há borracha capaz de apagá-los. Permanecem como fósseis cristalizados da história. Mas muda o significado dos acontecimentos. De fato, estes podem ser constantemente reinterpretados, mediante uma concepção histórica do tempo. De acordo com o professor Hermilo Preto, já falecido, fato e significado estão em esferas distintas. Enquanto os fatos são lidos em chave sociológica, seu significado pode revestir-se de uma roupagem de fé. Neste sentido, um encontro profundo no presente, um amor apaixonado, pela sua força e novidade, produz e emite luz própria. Luz cujos reflexos que podem retroagir e conferir novo sentido a meros acidentes do passado. É assim que, o encontro dos pecadores com Jesus, por exemplo, resgata nas pessoas o que elas possuem de mais profundo e sagrado: vontade de amar e ser amadas. O olhar de Jesus penetra no sacrário oculto do ser humano: não para expor em praça pública suas misérias e fraquezas, mas para curar. A exemplo do bisturi do cirurgião, rasga o tumor pra extirpá-lo e devolver a saúde ao paciente/pecador.

Por mais maldito que tenha sido a trajetória de uma pessoa, sempre é tempo de recomeçar. Ninguém está definitivamente salvo nem definitivamente perdido. Toda a história do Povo de Israel é interpretada e reinterpretada à luz de experiências profundas de Deus. É assim que a ressurreição de Jesus joga luz nova sobre sua vida e obras, suas palavras e gestos. Ilumina de forma especial o mistério ou a “loucura da cruz”. Um exemplo banal pode ilustrar melhor: imaginemos que dois homens sofrem um acidente automobilístico. Ambos vão parar n hospital. Um deles acaba por se apaixonar pela enfermeira de plantão, com o outro nada acontece de especial. Enquanto na memória futura do segundo, o acidente terá sido apenas uma fatalidade e um transtorno, para o segundo, ele se converterá numa benção. O amor e o encontro são luzes que podem ressegnificar as sombras do passado. Iluminá-las, diz-nos a psicologia, é exorcizar seus fantasmas.

Da mesma forma que os povos vizinhos, também a saga de Israel é transmitida de geração em geração através de um conjunto de mitos. Mas, diferentemente deles e da concepção do eterno retorno, os hebreus e depois os cristãos legaram ao mundo ocidental como herança o conceito de história em sequência linear e progressiva. A compreensão do passado é fator predominante para entender o presente e o futuro. Poder-se-ia dizer que Gênesis e Apocalipse se reencontram e se fundem, se cruzam e recruzam praticamente em cada livro bíblico, tanto do antigo como do novo testamento. Encontram-se e também se entrelaçam nas linhas e entrelinhas da visão histórica do renascimento e do iluminismo, como mostra, por exemplo, a filosofia de Maquiavel e J.G. Herder, F. Hegel e K. Marx, G. Vico e W. Dilthey.

Marc Augé, o antropólogo/etnólogo francês, com tempero fortemente filosófico, tem toda razão quando, em seu novo livro Où est passé l’avenir? sublinha a tentativa do poder para negar a história no contexto da modernidade ou pós-modernidade. O predomínio do presente constitui o objetivo implícito ou explícito de todo império. A memória e o sonho são subversivos, o passado e o futuro podem trazer, respectivamente, o espectro do dos mortos ou a inovação dos insatisfeitos. Em ambos os casos, a ordem se vê ameaçada. Daí a manutenção a todo custo do status quo. A tirania instala seu próprio tempo histórico, por uma parte, reduzindo a cinzas os monumentos dos ancestrais e apagando-lhes as pegadas, por outra, cerrando as portas a toda possibilidade de alternativa.

Fiscalização de imigrantes no retorno ao México

Autoridades americanas passam a fiscalizar ônibus que rumam para a fronteira - o que inibe ilegais de voltar ao país de origem

15 de agosto de 2011 | 0h 00

Marc Lacey, The New York Times - O Estado de S.Paulo


Um agente da imigração americana entrou no ônibus prestes a cruzar a fronteira entre Estados Unidos e México e pediu os documentos de todos os passageiros.

"Documentos", gritou, examinando atentamente as pessoas enquanto caminhava pelo corredor do ônibus.

Esse tipo de controle não é surpresa diante de toda atenção concentrada na imigração ilegal. Mas esse ônibus estava lotado de imigrantes que estavam deixando os Estados Unidos e não entrando no país.

Diversas leis de imigração sancionadas no Arizona e em outros Estados americanos estão tornando tão difícil a vida dos imigrantes ilegais que eles estão preferindo fazer a mala e voltar para casa. Mas a realidade na fronteira é outra: sair dos Estados Unidos está mais complicado do que nunca, o que levou muita gente a se preocupar com a possibilidade de essa fiscalização na saída não só dissuadir os imigrantes ilegais de deixar o país, mas colocá-los num beco sem saída, ultrajados se ficarem e potencialmente presos quando tentam deixar o solo americano.

Antigamente, entrar no México, vindo de San Diego, El Paso, Texas, ou Nogales, era muito fácil, sem nenhuma fiscalização do lado americano da fronteira e quase nenhuma averiguação do lado mexicano. Mas as medidas adotadas pelo governo Barack Obama para reduzir o fluxo de armas e dinheiro de drogas dos EUA para o México mudou a situação.

Os agentes entram nos ônibus a caminho do sul, o meio de transporte utilizado pelos imigrantes para retornarem às suas cidades e povoados. Nos postos de fronteira permanentes, os guardas também param os veículos e fazem uma acareação dos pedestres que cruzam a fronteira a pé.

Ao interrogar as pessoas que deixam o país, para saber se estão fazendo contrabando, os agentes com frequência deparam-se com imigrantes que não estão contrabandeando, mas não têm permissão para permanecer nos Estados Unidos. Os que não têm antecedentes criminais são autorizados a seguir. E como entram para a base de dados do governo, sofrerão penalidades mais severas se forem pegos novamente nos EUA. Os imigrantes com registros criminais enfrentam um tratamento mais agressivo. São presos e oficialmente deportados.

Segundo as autoridades, o objetivo não é desencorajar os imigrantes ilegais a sair do país, mas conter o fluxo do contrabando. De acordo com um recente relatório semanal do serviço alfandegário do Arizona, entre 18 e 24 de julho, foram confiscados US$ 22 mil em dinheiro e recuperadas 6 armas e 5.943 cartuchos de munição. Os agentes detiveram 1.606 imigrantes ilegais.

Em entrevistas, imigrantes de partida ofereceram diversas razões para deixar o Arizona. As leis e as varreduras da polícia tornaram sua vida impossível. A desaceleração econômica também dificultou a sobrevivência. Houve muitos que alegaram motivos de ordem pessoal. Para Analleli Ríos Ramírez, de 24 anos, foi a morte do cunhado, em Cuernavaca, que levou ela e o marido a voltar para o México, para ficar mais próximos da família. "Decidimos voltar a viver no nosso país", disse Analleli, que trabalhava como gerente de uma padaria num centro de compras próximo de Phoenix.

Alguns contestam essa averiguação de documentos dos imigrantes que deixam os Estados Unidos. E as críticas partem daqueles para quem os imigrantes ilegais são proscritos e dos que simpatizam com sua luta para melhorar de vida.

"Por que vamos usar recursos detendo pessoas que, de qualquer maneira, estão saindo do país?", pergunta Jennifer Allen, do grupo de direitos humanos de Tucson Border Action Network, que dá assistência aos imigrantes no Arizona. "Há pessoas que querem deixar os Estados Unidos e se perguntam se devem se arriscar."

A possibilidade de a política do governo desencorajar os imigrantes ilegais de sair do país tem levado até mesmo grupos que defendem controles mais rígidos nas fronteiras a pensar duas vezes sobre essa fiscalização das pessoas que seguem para o sul. "É a única situação em que defendemos uma modificação nas nossas leis de imigração", disse William Gheen, presidente do Americans for Legal Immigration PAC, no ano passado.

"Dificultar a saída pode levar alguns imigrantes a, em vez de deixar o Arizona e outros Estados com leis imigratórias severas, mudar-se para regiões mais hospitaleiras do país", diz William Gheen.

Apesar de milhares de imigrantes terem sido detidos na saída para o México, as autoridades dizem que não podem calcular o número dos que foram detidos por permanência ilegal no país em relação aos que foram presos por contrabando. E alguns imigrantes disseram ter sido confundidos pela polícia.

Temor. Recentemente, quando se preparava para cruzar a fronteira e se reunir com o marido, que já havia partido para o México meses antes, Analleli Ríos Ramírez começou a ficar nervosa, pois não estava com os documentos em ordem. Ela entrou ilegalmente nos Estados Unidos há mais de uma década, com 11 anos, acompanhando a mãe. Agora, retorna a um país que mal conhece. "Acho que é essa a vontade do Arizona: que eu deixe o país", disse ela, embalando seus pertences, antes de partir. "E a minha preocupação é que possam me pegar na saída." Mas ela e sua picape carregada cruzaram a fronteira que separa Nogales, Arizona, da Nogales mexicana, sem nenhum problema.

Funcionários da imigração dizem que não conseguem fiscalizar todas as pessoas e procuram ser discretos quando examinam os documentos dos imigrantes de saída. A mãe de Analleli, Teodora Martínez, saiu do país alguns meses antes e não tinha documentos quando um agente abordou o ônibus em que ela viajava. Teodora apresentou um cartão de identidade emitido pelo consulado mexicano em Phoenix, que não provava residência legal. O marido dela, Cesar Valle Martínez, mostrou uma identidade falsa. O agente examinou os papéis com desconfiança e depois conversou com um colega que também estava no ônibus. O casal viajava com várias crianças que possuíam passaporte americano.

"Podem ir", disse finalmente o agente, que devolveu os documentos e saiu do ônibus, permitindo que a família retornasse ao México. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

É JORNALISTA

domingo, 14 de agosto de 2011

Jardim da Saudade - de frei Betto para Frei Tito‏

Jardim da Saudade (Ao meu irmão, Frei Tito)

Frei Betto

Frade dominicano e escritor. Viveu junto com Tito no convento dos frades dominicanos em São Paulo. Autor de Batismo de Sangue em que relata a luta política de Frei Tito.

Na terça-feira. 17 de fevereiro de 1970, oficiais do Exército retiraram Frei Tito de Alencar Lima do Presídio Tiradentes, onde se encontrava preso desde 1969, acusado de subversão. “Você agora vai conhecer a sucursal do inferno”, disse-lhe o capitão Maurício Lopes Lima.

No quartel da rua Tutóia, um outro prisioneiro, Fernando Gabeira, testemunhou o calvário de frei Tito: durante três dias, dependurado no pau-de-arara ou sentado na cadeira-do-dragão -feita de chapas metálicas e fios-, recebeu choques elétricos na cabeça, nos tendões dos pés e nos ouvidos. Deram-lhe pauladas nas costas, no peito e nas pernas, incharam suas mãos com palmatória, revestiram-no de paramentos e o fizeram abrir a boca “para receber a hóstia sagrada” - descargas elétricas na boca. Queimaram pontas de cigarro em seu corpo e fizeram-no passar pelo “corredor polonês”.

O capitão Beroni de Arruda Albernaz vaticinou: "Se não falar, será quebrado por dentro. Sabemos fazer as coisas sem deixar marcas visíveis. Se sobreviver, jamais esquecerá o preço de sua valentia". A ceder e viver, Tito preferiu morrer. “É preferível morrer do que perder a vida", escreveu ele em sua Bíblia. Com uma gilete, cortou a artéria do braço esquerdo. Socorrido a tempo, sobreviveu.

Foi libertado em dezembro de 1970, incluído entre os prisioneiros políticos trocados pelo embaixador suíço, seqüestrado pela VPR. Ao desembarcarem em Santiago do Chile, um companheiro comentou: “Tito, eis finalmente a liberdade!”. O frade dominicano murmurou: “Não, não é esta a liberdade”.

Em Roma, as portas do Colégio Pio Brasileiro, seminário destinado a formar a elite do nosso clero, fecharam-se para o religioso com fama de "terrorista". Em Paris, nossos confrades o acolheram no convento de Saint Jacques, em cuja entrada uma placa recorda a invasão da Gestapo, em 1943, e o assassinato de dois dominicanos.

O capitão Albernaz tinha razão: sufocado por seus fantasmas interiores, Tito tornou-se ausente. Ouvia continuamente a voz rouca do delegado Fleury, que o prendera, e o vislumbrava em cafés e bulevares. Transferido para o convento de I'Arbresle, construído por Le Corbusier, nas proximidades de Lyon, as visões aterradoras continuaram a minar sua estrutura psíquica. Escrevia poemas:

“Em luzes e trevas derrama o sangue de minha existência / Quem me dirá como é o existir / Experiência do visível ou do invisível”.

Os médicos recomendaram-no suspender os estudos para dedicar-se a trabalhos manuais. Empregou-se como horticultor em Villefranche-sur-Saône e alugou um pequeno cômodo numa pensão de imigrantes, o Foyer Sonacotra, cujas despesas pagava com o próprio salário. O patrão o percebeu indolente, ora alegre, ora triste, sugado por um tormento interior. Em seu caderno de poemas, Tito registrou:

“São noites de silêncio / Vozes que clamam num espaço infinito / Um silêncio do homem e um silêncio de Deus”.

No sábado, 10 de agosto de 1974, frei Roland Ducret foi visitá-lo. Bateu à porta de seu quarto, na zona rural. Ninguém respondeu. Um estranho silêncio pairava sob o céu azul do verão francês e envolvia folhas, vento, flores e pássaros. Nada se movia. Sob a copa de um álamo, o corpo de Frei Tito dependurado por uma corda, balançava entre o céu e a terra. Ele tinha 28 anos.

Em março de 1983, seus restos mortais retornaram ao Brasil. Acolhidos em solene liturgia na Catedral da Sé, em São Paulo, encontram-se enterrados em Fortaleza, sua terra natal. O cardeal Aros frisou que Tito afinal encontrara, do outro lado da vida, a unidade perdida.

Nos eventos que ocorreram em várias cidades do país, rezamos juntos o poema que Tito escreveu em Paris, a 12 de outubro de 1972:

“Quando secar o rio da minha infância / secará toda dor. Quando os regatos límpidos de meu ser secarem / minh'alma perderá sua força. Buscarei, então, pastagens distantes / lá onde o ódio não tem teto para repousar. Ali erguerei uma tenda junto aos bosques. Todas as tardes, me deitarei na relva / e nos dias silenciosos farei minha oração. Meu eterno canto de amor: / expressão pura de minha mais profunda angústia. Nos dias primaveris, colherei flores / para meu jardim da saudade. Assim, exterminarei a lembrança de um passado sombrio”.

Mostra Xenofobia no Cinusp‏

O Cinema da USP “Paulo Emílio” (Cinusp) realiza a mostra Xenofobia, entre os dias 15 e 24. A mostra tem por objetivo apresentar as diversas facetas do tema, ainda muito atual e de importante discussão dentro e fora da Universidade.

Entre os filmes a serem exibidos estão O homem que virou suco (Brasil, 1981, 90 minutos), O profeta (França, 2009, 150 minutos), Hotel Ruanda (África do Sul, Estados Unidos, Itália e Reino Unido, 2004, 121 minutos) , Faça a coisa certa (Estados Unidos, 1989, 120 minutos), Gran Torino (Estados Unidos, 2008, 116 minutos), Crash – no limite (Alemanha e Estados Unidos, 2005, 113 minutos) e A banda (Estados Unidos, França e Israel, 2007, 87 minutos).

Para mais informações sobre a mostra e sua programação, entre em contato pelo telefone (11) 3091-3540 / 3091-3152 , email cinusp@usp.br , ou acesse o site do Cinusp. A entrada é gratuita e o cinema comporta 100 espectadores. O Cinusp fica na Rua do Anfiteatro, 181, Colmeia, Favo 04, Cidade Universitária, São Paulo.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Evangélicos sem espetáculo

Internacional

Evangélicos sem espetáculo

Pessoas religiosas e seculares fazem um grande trabalho humanitário, mas às vezes não trabalham juntas por suspeitas mútuas

08 de agosto de 2011 | 0h 00

Nicholas D. Kristof, The New York Times - O Estado de S.Paulo


Nesta época de polarizações, poucas palavras provocam tanta aversão nos ambientes liberais quanto "cristão evangélico".

Em parte, isto se explica porque, nos últimos 25 anos, os evangélicos foram associados a personagens rabugentos e fanfarrões. Quando os reverendos Jerry Falwell e Pat Robertson debateram na televisão se os ataques de 11 de Setembro foram uma punição de Deus contra as feministas, os gays e os secularistas, Deus deveria tê-los processado por difamação.

Anteriormente, Falwell defendera que a aids é "o julgamento de Deus sobre a promiscuidade". Esta presunção religiosa permitiu que o vírus da aids se espalhasse, constituindo uma imoralidade maior do que tudo o que poderia acontecer nas saunas gays.

Em parte, por causa desta postura bem-pensante, todo o movimento evangélico frequentemente foi condenado pelos progressistas como reacionário, míope, irracional e até mesmo imoral.

Entretanto, esse menosprezo casual é profundamente injusto, se considerarmos o movimento como um todo. Ele reflete um tipo de intolerância às avessas, às vezes um fanatismo às avessas, dirigido contra dezenas de milhões de pessoas que na realidade se envolveram cada vez mais na luta contra a pobreza e na defesa da justiça global.

Essa linha compassiva da corrente evangélica foi dotada de bases extremamente sólidas pelo reverendo John Stott, um moderado estudioso inglês que influiu de maneira muito mais importante no cristianismo do que astros da mídia como Robertson ou Falwell. Stott, que morreu há alguns dias aos 90 anos, foi incluído na lista das cem pessoas mais influentes do globo da revista Time. Em termos de estatura, às vezes foi considerado o equivalente do papa entre os evangélicos de todo o mundo.

Stott não pregou acenando com a ameaça das penas do inferno numa rede cristã de televisão. Ele foi um humilde estudioso cujos 50 livros aconselham os cristãos a emular a vida de Jesus - principalmente sua preocupação com os pobres e os oprimidos - e a se opor a mazelas sociais como a opressão racial e a poluição ambiental.

"Os bons samaritanos sempre serão necessários para socorrer os que foram assaltados e roubados; entretanto, seria melhor acabar com os bandoleiros na estrada de Jerusalém a Jericó", escreveu Stott em seu livro A Cruz de Cristo. "Por isso, a filantropia cristã em termos de alívio e ajuda é necessária, mas muito melhor seria um aprimoramento a longo prazo, e nós não podemos fugir da nossa responsabilidade política e da necessidade de participar da transformação das estruturas que inibem este aprimoramento. Os cristãos não podem olhar com tranquilidade as injustiças que arruínam o mundo de Deus e degradam suas criaturas".

Stott deu exemplos das injustiças contra as quais os cristãos precisam lutar: "os traumas da pobreza e do desemprego", "a opressão das mulheres", e na educação, "a negação de iguais oportunidades a todos".

Para muitos evangélicos que sempre se retraíam quando um "televangélico" ganhava as manchetes, Stott era um guru intelectual e uma inspiração. Richard Cizik, presidente da Nova Igreja Evangélica Parceria para o Bem Comum, que trabalhou heroicamente para combater desde o genocídio até a mudança climática, me disse: "Contra a charlatanice e a irracionalidade no nosso movimento, Stott permitiu afirmar que você é "evangélico" e não deve se arrepender".

O reverendo Jim Wallis, diretor de uma organização cristã chamada Sojourners (Os visitantes), que trabalha em prol da justiça social, acrescentou: "John Stott foi o primeiro líder evangélico importante que defendeu o nosso trabalho na Sojourners". Stott, que foi um aluno brilhante em Cambridge, também ressaltou que a fé e o intelecto não precisam ser conflitantes.

Há muitos séculos, o estudo profundo da religião era extraordinariamente exigente e rigoroso; por outro lado, qualquer um podia declarar-se cientista e passar a exercer a alquimia, por exemplo. Hoje, é o contrário. Um título de doutor em química exige uma formação rigorosa, enquanto um pregador pode explicar a Bíblia pela televisão sem dominar o hebraico ou o grego - ou mesmo sem mostrar interesse pelas nuances dos textos originais.

Os que se denominam líderes evangélicos revelam-se hipócritas, transformando Jesus em lucro em lugar de emulá-lo. Alguns parecem inclusive homofóbicos, e muitos que se declaram "a favor da vida" parecem pouco preocupados com a vida humana depois que ela sai do útero. São os pregadores que aparecem nas manchetes e são menosprezados.

Escrevendo sobre a pobreza, as doenças e a opressão, encontrei outros ainda. Os evangélicos estão desproporcionalmente dispostos a doar o dízimo do que ganham a obras de caridade, em geral ligadas à igreja. O mais importante é que se procuramos nas linhas de frente, nos EUA ou no exterior, nas batalhas contra a fome, a malária, as violações nas prisões, a fístula obstétrica, o tráfico de pessoas ou o genocídio, alguns dos mais corajosos que encontramos são cristãos evangélicos (ou católicos conservadores, que a eles se assemelham de muitas maneiras) que vivem verdadeiramente a sua fé.

Não sou particularmente religioso, mas reverencio os que vi arriscando sua vida dessa maneira - e me enoja ver esta fé ridicularizada em coquetéis em Nova York.

Por que tudo isto é importante?

Porque tanto as pessoas religiosas quanto as seculares fazem um trabalho fantástico em questões humanitárias - mas elas frequentemente não trabalham juntas em razão das suspeitas mútuas. Se pudermos superar este "abismo divino", poderemos progredir muito mais no combate às mazelas do mundo.

E esta seria, realmente, uma dádiva divina. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA


É COLUNISTA

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

OS NOVOS ROSTOS DA IMIGRAÇÃO PARA O BRASIL

Brasil, terra imensa, quinto maior país do mundo em extensão territorial, com uma população de 193 milhões de habitantes. Em 1818 o Brasil adotou a sua primeira política imigratória trazendo, primeiramente, suíços para Nova Friburgo e, sobretudo, alemães, os quais se estabeleceram em maior número na região do Sul do país. A partir da crise do cativeiro, foram trazidos para a lavoura, italianos, espanhóis, portugueses, japoneses, entre outros. No pós-guerra, o Brasil privilegiou a vinda de mão de obra especializada, em especial através dos refugiados de guerra, pois já havia implementado seu processo de industrialização. Entre os anos de 1950 e 1980, a imigração para o Brasil praticamente cessou e foi a vez da migração interna ocupar o cenário. Neste período, o Brasil deixou de ser um país com sua população majoritariamente morando no campo para transformar-se num país urbano, com grande concentração nas Regiões Metropolitanas.

A partir dos anos 1960, novos imigrantes começaram a chegar: bolivianos (que já se faziam presentes nas décadas anteriores), coreanos, e os que fugiam das ditaduras do Cone Sul – chilenos, uruguaios, argentinos e paraguaios. Já na década de 1980, os bolivianos que chegavam mudaram de perfil: não mais estudantes ou profissionais liberais, mas trabalhadores braçais para o ramo das confecções. Já no final dos anos 1990, ingressaram outros imigrantes, vindos dos países andinos (peruanos e colombianos), mas a maior novidade foi a chegada de africanos, em especial vindos de Angola e da República Democrática do Congo, na condição de refugiados. Todavia, hoje o Brasil recebe, embora de maneira pulverizada, africanos de muitos países.
Assim sendo, como indica o documento de Aparecida, há milhões de pessoas que por diferentes motivos estão em constante mobilidade. Na América Latina e no Caribe os emigrantes, deslocados e refugiados, sobretudo por causas econômicas, políticas e de violência constituem fato dramático (nº 411). Desta vez, desde 2010, nesse fluxo migratório para o Brasil temos a presença inesperada de um pequeno contingente, vindo do Caribe, em busca de um novo recomeço.

Poucos dias após a celebração dos 206 anos da Independência do Haiti, em 1º de janeiro, no dia 12 de janeiro de 2010, precisamente às 16h53m, no Haiti, aconteceu uma das maiores tragédias do mundo. Isto é, o maldito terremoto que deixou as marcas de sua raiva no país caribenho, destruindo toda a capital e outras regiões, deixando milhões de vítimas. Foi um ano marcado por tristezas, traumas, lágrimas, perdas de vidas e de bens materiais. E logo em seguida, uma epidemia de cólera atingiu a população. Segundo pesquisas internacionais e algumas especulações, essa epidemia foi trazida pelas Forças de Paz em Missão no país caribenho, causando ainda novas vítimas. Como se não bastasse, logo em seguida, o país se viu envolto na farsa política das fraudulentas eleições presidenciais, mas que foi imediatamente resolvida com a ajuda da Comunidade Internacional. Essa crise (fraude), segundo especulações, foi imposta pelo governo para continuar no poder, e que era também a favor da permanência das Forças Ocupantes. Diante de tudo isso, a pergunta que se faz: O que fazer? Para onde ir?

Após o violento e devastador sismo, muitas das vítimas e sobreviventes, na tentativa de reescrever a gênese de um sonho, caminharam para outras terras. Alguns para a América do Norte (Estados Unidos e Canadá), outros para América Latina (Brasil, Equador, Argentina...) e alguns outros para outros países.

Para o Brasil, nunca houve migração haitiana, apesar de o Brasil ser um país com fama de acolhedor. Depois do abalo, isso não tardou para acontecer e hoje, há migrantes haitianos no Brasil. Mas será que isso é “migração” ou apenas uma “pequena onda migratória”? Que chamemos isso de migração ou não, ou ainda de onda migratória, em nada altera o sentido. Falta muito ainda para que esse fluxo seja chamado “migração”, comparado com o tamanho do Brasil. Por razões diversas, prefiro chamá-lo de: pequena onda migratória. A cada vez que uso “onda”, refiro-me a algo pequeno ou partícula.

Essa pequena onda de migração haitiana é tema de debate por parte das autoridades dos países para onde estão migrando, e ainda dos meios de comunicação. Aí surge uma grande preocupação por parte das autoridades. Em Manaus, um dos lugares em que mais cresce essa pequena onda migratória, com a chegada desses haitianos. De fato, nem todos estão vindo diretamente do Haiti para o Brasil. Muitos estão vindo de outros países, como Equador, Santo Domingo, Argentina, Chile, etc., queixando-se de que a renda desses países não lhes é favorável, é pouca. Assim, acabam saindo à procura de outros lugares. A maioria dos que saíram do Haiti, tenta usar as fronteiras brasileiras como lugar “de passagem ou rota” (migrantes de trânsito) a fim de chegar a outro destino, Guiana Francesa ou outros países. Os que ficam estão sendo acompanhados, acolhidos, orientados pastoralmente pela ação social da Igreja-Mãe, nos lugares onde eles se encontram. Quanto a isto, o documento de Aparecida, nos lembra: “A Igreja, como Mãe, deve se sentir como Igreja sem fronteiras, Igreja familiar, atenta ao fenômeno crescente da mobilidade humana em seus diversos setores. Considera indispensável o desenvolvimento de uma mentalidade e uma espiritualidade a serviço pastoral dos irmãos em mobilidade, estabelecendo estruturas nacionais e diocesanas apropriadas, que facilitem o encontro do estrangeiro com a Igreja local de acolhida. As Conferências Episcopais e as Dioceses devem assumir profeticamente esta pastoral específica com a dinâmica de unir critérios e ações que favoreçam uma permanente atenção também aos migrantes, que devem chegar a ser também discípulos e missionários, o nº 412”. À chegada desses migrantes, descobre-se que a grande maioria é evangélica.

Essa pequena onda migratória haitiana é bem recebida por parte da população e sustentada com a solidariedade, a ação social e a caridade da Igreja, conforme afirma o documento de Aparecida: “É expressão de caridade, também eclesial, o acompanhamento pastoral dos migrantes” o nº411. Do ponto de vista político, da forma que isso vem ocorrendo, percebe-se que não houve um acordo entre os dois governos (Brasil e Haiti) dizendo: vamos receber tal quantidade de haitianos. Na verdade, a pessoa ou o grupo que vai migrar não espera essas coisas. Sendo assim, pode-se notar que está ocorrendo uma onda migratória de forma desordenada. Nem mesmo responsáveis do Brasil sabem o que dizer diante disso. Pois bem, essa pequena onda migratória haitiana para o Brasil é vista como de “migrantes ambientais ou de pessoas vítimas de desastres naturais”, em busca de trabalho e moradia, para voltarem a sonhar, e a manter a eles mesmos e às suas famílias. Essas vítimas são igualmente conhecidas como “desplazadas”, por razões de caráter ambiental e/ou econômico. No total, estima-se que pelo menos 1500 vítimas haitianas do terremoto já chegaram ao Brasil, sem contar os que estão na fronteira com a Colômbia, em Tabatinga, à espera de documentação, para depois alcançarem a capital amazonense, Manaus. O documento de Aparecida, bem no final, ainda recorda que “a realidade das migrações não deve nunca ser vista só como problema, mas também e, sobretudo, como grande recurso para o caminho da humanidade”, o nº 413.

Essa pequena onda migratória, em nada afeta o Brasil; pelo contrário, o favorece. O Brasil é um país em crescimento, onde a mão de obra é necessária. A pergunta que nos fazemos é: Não seria melhor organizada essa onda, se houvesse um acordo bilateral entre os dois países para acolher um certo número de migrantes haitianos no Brasil?

Chegando ao final dessa pequena reflexão, como estudante religioso, vivendo no Brasil, gostaria, enfim, de agradecer em nome dos meus irmãos haitianos, “migrantes ambientais ou deslocados”, a todo o povo brasileiro, sobretudo, ao povo amazonense pela acolhida dada a esses irmãos. Por outro lado, um agradecimento que vai ainda ao Conselho Nacional de Imigração, ao Instituto de Direito Humano, enfim, a todos os que acolheram e continuam a acolhê-los. Torcemos para que os favoreçam com a documentação, a fim de que se sintam livres nessa terra acolhedora, como pátria que lhes dá pão e trabalho. Não podemos esquecer os padres e irmãs scalabrinianos, engajados nessa missão nos vários Estados do Brasil, de maneira mais especial, em Manaus, servindo o povo migrante, em particular, depois do terremoto, os haitianos deslocados. Por fim, a todos os diferentes serviços pastorais e instituições da sociedade civil; leigos e missionários que estão ajudando a esses irmãos a se integrarem, na medida possível, na cultura e no mercado do trabalho. Que Deus abençoe esta terra amada, Brasil!

Pierre Dieucel
Estudante Religioso Scalabriniano em Teologia
http://www.dieucel.blogspot.com

DOUTORAMENTO EM MIGRAÇÕES ::: até 15 de Setembro‏

Área Estratégica das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa
Candidaturas ao Doutoramento em Migrações
Até 15 de Setembro

Os candidatos ao programa de doutoramento em Migrações devem formalizar a sua candidatura nos serviços académicos do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território, através do preenchimento do Formulário próprio para Candidatura.

Email: academicos@igot.ul.pt

Nigerianos e a rejeição do Japão‏

Estigmatização e Relações de Poder num mesmo contexto: o modelo de análise do sociólogo Norbert Elias pode nos ajudar a pensar o que segue abaixo...

Pergunta: por quê em contextos estrangeiros os conflitos de poder tornam-se mais acentuados? A questão pode parecer simples, mas a resposta pode reforçar a necessidade de pensarmos a condição sofrível dos migrantes que vão ficando nas margens da socialização!

/Internacional

Nigerianos e a rejeição do Japão

Organização civil se empenha para que imigrantes africanos sejam bem-vindos e vistos como socialmente conscientes

30 de julho de 2011 | 0h 00

Dreux Richard - O Estado de S.Paulo

A União Nigeriana do Japão é uma organização civil que representa os imigrantes do país mais populoso da África. Foi fundada duas vezes em 21 anos, e a nova entidade tem menos de um ano. Sua história confusa reflete os conflitos econômicos e sociais vividos pela comunidade nigeriana no Japão nas últimas décadas.

Seus membros são trabalhadores de fábricas e empreendedores do setor de entretenimento noturno de passagem pelo país. Eles têm sido responsabilizados por alguns problemas ligados ao crime em Tóquio, especialmente por uma série de incidentes relacionados com mistura de drogas em bebidas e notas de consumo com itens falsos, o que levou a Embaixada dos Estados Unidos em Tóquio a emitir um alerta em 2009 para os turistas não visitarem Roppongi. Mas salvo esses incidentes, a história desses imigrantes no Japão tem sido escrita com muito esforço.

O presidente de honra da União Nigeriana, Okeke Christian Kevin, sabe que herdou um problema difícil de solucionar, e precisa resolver se o seu desejo é aumentar a mobilidade social de seus representados. Para esse fim, a União Nigeriana organizou duas arrecadações de fundos para ajudar as vítimas do tsunami, na esperança de que os nigerianos de Tóquio comecem a ser vistos como imigrantes socialmente conscientes que investem no bem-estar do país que adotaram.

Kennedy Fintan Nnaji é o atual presidente da Imo State Union, uma das maiores e mais ativas organizações que fazem parte da União Nigeriana. Fundada em 2002, a organização sempre se empenhou, mesmo quando a União Nigeriana ficou inativa.

Okeke e Njani presidem essas organizações num dos momentos mais promissores na história da Nigéria. O segundo evento para arrecadação de fundos foi realizado no dia em que o presidente nigeriano, Goodluck Jonathan, assumiu o cargo. Muitos membros da comunidade nigeriana no Japão, a maioria de língua Igbo - 3.500 pessoas, oficialmente, mas é provável que o número seja muito maior - esperam que a eleição justa e transparente de um outsider da etnia Ijaw para presidente indique o fim da marginalização que caracterizou a vida no seu país natal.

No evento de arrecadação de fundos, Nnaji atacou aberta e agressivamente o sistema, o que Okeke não poderia fazer por causa de sua posição. O debate desencadeado por Nnaji seria muito mais importante se as 40 autoridades da União Nigeriana não superassem em número os 36 presentes ao evento. A participação fraca evidenciou o grande obstáculo que a nova União Nigeriana enfrenta: a profunda amargura sentida por muitos nigerianos que trabalham na vida noturna de Tóquio, muitos sentindo-se discriminados por uma sociedade fechada onde o seu sucesso é recebido com racismo e xenofobia.

"Há dois tipos de imigrantes que chegaram aqui como trabalhadores", disse Kennedy Fintan Nnaji. "Aqueles que querem ganhar o máximo possível no curto prazo e depois voltar à Nigéria, e os que tentam se inserir na vida japonesa." Muitos imigrantes nigerianos não fazem parte de nenhuma dessas categorias quando chegam ao Japão. Se decidem investir na cultura, isso vai depender das experiências vividas aqui e, dependendo das circunstâncias, alguns que poderiam "se integrar na sociedade" se tornam pessoas calejadas e oportunistas.

Hip-hop. Em 2005, a alfândega começou a confiscar carregamentos de roupas estilo hip-hop de empresas nigerianas. Elas ocasionalmente vendiam produtos falsificados. A resposta da mídia e dos políticos locais teve uma conotação racista e xenófoba, insistindo para as autoridades japonesas reformularem o perfil dos africanos, associando os crimes à etnia dos que os cometeram.

Como reação, muitas lojas de moda hip-hop fecharam. Alguns proprietários passaram a exportar peças automotivas ou componentes elétricos, mas muitos não tinham o conhecimento necessário do negócio.

Em 2006, a comunidade nigeriana passou por mais uma migração econômica, desta vez focada no setor de entretenimento noturno e, especialmente, para Roppongi, onde alguns empresários nigerianos já estavam bem estabelecidos. Quase que imediatamente, começaram as acusações de mistura de drogas em bebidas servidas nos bares e adulteração de contas de consumo para aumentar seu valor. As queixas eram por demais numerosas para a embaixada dos EUA ignorar, e ela, então, emitiu um alerta a respeito, nomeando vários clubes.

Os nigerianos que trabalham na área do entretenimento noturno sentem que foram levados a isso e depois chamados de trapaceiros. Muitos esperam conseguir voltar à estabilidade do trabalho na fábrica. Embora não se deva culpar a sociedade japonesa por ser relativamente fechada, também não se pode culpar os imigrantes nigerianos pelo profundo ressentimento com a maneira dura como foram tratados por tentar encontrar um lugar na periferia dessa sociedade.

"Não importa quanto tempo você vive no Japão, jamais será amigo de um japonês", disse Basil, dono do Treasures Gentlemen"s Club, em Roppongi. Casado durante 14 anos com uma japonesa, os sogros se recusaram a conhecê-lo. Ele pretende retornar à Nigéria, onde, depois de ter se divorciado, casou-se novamente e tem filhos.

Os desafios enfrentados pelas famílias nigerianas dão a exata dimensão dos custos sociais ocultos da marginalização da comunidade - custos que não podem ser convenientemente limitados a Roppongi, ou à população imigrante. Depois do evento de arrecadação de fundos, Okeke tentou fazer uma divulgação para atrair mais doações. Ele não tem nenhum conhecimento de relações públicas, nem contato com a imprensa, mas conseguiu que um jornal japonês e uma revista fizessem uma reportagem sobre a história da União Nigeriana. Também recorreu a instituições beneficentes multinacionais, num esforço para criar parcerias com organizações mais experientes na realização de trabalhos sociais.

Ressentimento. Mas ele precisa lutar com décadas de ressentimento. Em junho, a instituição beneficente que receberia o dinheiro organizou um evento para arrecadar doações em conjunto com a União Nigeriana, esperando conseguir uma grande cobertura da mídia. Menos de 24 horas antes do evento, os membros da União cancelaram o encontro, alegando que já tinham feito o suficiente e era indecoroso pedir ao presidente da União que solicitasse mais doações dos cidadãos japoneses.

Oeke não se desencorajou. "Estou lutando para que todos vejam o sentido da unidade", disse. "Considero prioritário limpar a imagem dos nigerianos aqui, de modo que fique clara a contribuição deles como membros produtivos da sociedade."

Seja qual for o resultado, Kennedy Fintan Nnaji tem um papel-chave. Se conseguir registrar a Imo State Union como organização não lucrativa, terá criado a maior oportunidade jamais vista para ajudar a comunidade nigeriana a se afirmar como autêntica colaboradora da sociedade japonesa. "Minha missão na Imo State Union é conseguir envolver as pessoas na sociedade civil e no serviço à comunidade", disse. "Somos estrangeiros. É nossa obrigação mostrar ao Japão o que somos e o que podemos fazer. Se formos humildes e trabalharmos diligentemente, seremos reconhecidos."

Os planos de Okeke e Nnaji podem ser bastante astutos para funcionar e dar voz às infatigáveis esperanças de seus membros menos obstinados. Mas terão pouco resultado se a comunidade, no geral, já estiver muito cansada para ouvi-los. "Trabalhar individualmente numa terra estranha é difícil. Precisamos nos expressar com uma única voz", disse Nnaji. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
É JORNALISTA